quinta-feira, 30 de setembro de 2010

Memórias de Quinta

Se você perguntar a um piloto de Formula 1 todos dirão, falta de motivação não é muito comum para definir o estado de espírito de uma profissão em que se pratica vestido de astronauta, envolto por dezenas de litros de gasolina, sentindo na nuca a vibração de um motor de 800 cavalos e freando a 250 por hora para, se Deus quiser, contornar a próxima curva com a faca nos dentes.

Pilotos desmotivados existem, mas continuam correndo muito.

Era o caso de Ayrton Senna naquele GP dos Estados Unidos em 1990, após a empreitada para conseguir o titulo mundial de 89, perdido para os cartolas, Senna conseguiu apenas que sua superlicença fosse caçada, e que fosse obrigado a fazer um pedido de desculpas formal e público para Jean Marie Balestre, se redimindo das acusações feitas à FISA de que a entidade tinha manipulado o campeonato anterior, só assim conseguiu recuperar a superlicença.

Balestre no grid do GP dos Estados Unidos de 1990
Já nos treinos Senna estava diferente, sonolento ao iniciar um novo campeonato que poderia lhe dar o bicampeonato, tanto que na sexta-feira viu seu novo companheiro Gehard Berger fazer o melhor tempo e ele ficando apenas em quinto lugar. No sábado, uma chuva na hora do treino impediram qualquer piloto de melhorar o que haviam conseguido.

Piquet na chuva do sábado
Domingo logo após o warm-up, Senna demonstrou uma preocupação pouco comum, "O carro foi muito bem no warm-up, mas eu é que não estou bem. Normalmente, em dias de corrida, tenho que me esforçar para me manter calmo, e hoje ocorreu o contrário. Estava calmo demais para o meu normal e tive até que me beliscar para acordar e entrar no clima da corrida".
Senna também no Grid

Na largada, Senna vai de quinto para quarto, Berger perde a ponta da corrida para o novato Jean Alesi. Alesi já vinha demonstrando potencial ao fim de 89, e essa prova era a sua chance de mostrar seu real valor.

A prova se desenrola e Senna coloca uma pressão fulminate em Berger na briga pela segunda posição, definida pelo próprio Berger em seu livro "nem mesmo Ayrton poderia suportar aquele ritmo por muito tempo. Era o seu instinto meio matador, meio suicida. Pela primeira vez, eu me senti pessoalmente derrotado. Senna passava a ter, pra mim, o valor que já tinha no mundo do esporte. E isso tornou as coisas mais difíceis para mim”. Após algumas voltas sob pressão de Senna, Berger escapou e bateu sozinho no muro de Phoenix.
Largada GP dos Estados Unidos
 Era a primeira corrida em que Berger dividia a Mclaren com Senna.

Ayrton se viu acordando para a Formula 1, já no meio da corrida, seguindo a Tyrrel de Jean Alesi na briga pela ponta, ainda desmotivado, se é que se pode dizer assim, Senna seguiu o padrão, pegou o vácuo do francês na reta e retardando a freada, passou a frente. Só não contava com a ousadia de Alesi que na curva seguinte, surpreendeu Senna retomando a liderança.

O inesperado drible acordou Senna, que logo depois fez o mesmo procedimento, só que desta vez, sem dar espaço ao francês para o troco, Senna ainda arrumou tempo para um provocador tchauzinho na ultrapassagem.

Sem Alesi pela frente, Senna seguiu tranquilo para sua vigésima primeira vitória na Formula 1, ultrapassando Nelson Piquet e se tornando o brasileiro com mais números de vitórias na Formula 1.

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